A sensação de vazio, pode-se manifestar de várias formas e em vários contextos e alturas da vida de uma pessoa. Normalmente, este torna-se uma queixa quando vira um “sintoma” sendo sentido constantemente. Muitas queixas revelam este sentimento mais num contexto existencial, afinal qual é o sentido da minha vida? Qual é o meu propósito? Será que tive o rumo mais indicado até aqui? Em certas alturas da vida é normal a pessoa se questionar da vida levou e de como poderia ter sido se seguisse diferentes caminhos. No entanto, a problemática reside quando existe angústia por trás desse sentimento que se torna constante, e a pessoa começa a ter comportamentos para tentar camuflar ou amenizar esse sentimento.
A sensação de vazio é presenciada segundo a literatura nas três estruturas de: personalidade borderline; neurose, e; na psicose. Mesmo que em contextos diferentes, observamos que estas manifestações vão desde a melancolia à psicossomática (quando o paciente começa por somatizar e a transferir para o corpo a sua angústia). O que se encontra em comum nas pessoas que referem este sentimento, é um Eu frágil e fragmentado que procura refúgios como a religião, medicação, drogas, alimentação e exercícios de diversas modalidades, procurando assim preencher a ausência presenciada. Entretanto, essa falta se dá pelo fato do medo de uma desconstrução, não permitindo esclarecer e nomear o que ocorre dentro de si. Apesar de poder estar presente nas várias estruturas de personalidade, o sentimento de vazio é mais prevalente nas estruturas borderline da personalidade, sendo quase, um sentimento de vazio crónico1Glória, B., Panizzi, F., & Medianeira De Mello, M. (n.d.). PATOLOGIAS DO VAZIO NA CONTEMPORANEIDADE: UMA REVISÃO DA LITERATURA 2018. https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A1236.pdf.
Devido à personalidade instável, o borderline não possui uma estrutura rígida que lhe permita suportar a dor de uma rejeição ou até antever a possibilidade de um abandono, vivendo em constante insatisfação e de sentimento de vazio, por considerar que precisa sempre de estar preso e suportado por alguém2Glória, B., Panizzi, F., & Medianeira De Mello, M. (n.d.). PATOLOGIAS DO VAZIO NA CONTEMPORANEIDADE: UMA REVISÃO DA LITERATURA 2018. https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A1236.pdf. Isto leva a tentativas exacerbadas de preencher este vazio, seja por compulsões ou pela busca constante de alguém que preencha esse vazio – o que, no fundo, nunca chega a se suceder. A angústia surge aqui como consequência da frustração entre aquilo que é desejado, aquilo que é possível, a sensação de falta de realização e a sensação de que falta algo.
Com recurso à psicoterapia, é possível aprofundar estas questões, e tentar compreender em conjunto com a pessoa qual poderá ser a origem da insatisfação com a vida, que causa sentimentos de angústia e de uma insaciável sensação de vazio. De facto, por muito que se tenha comportamentos para tentar camuflar esse vazio (ou angustia), estes acabarão por sair frustrados, pois para além de muitos deles serem autolesivos, eles acabam por não preencher de todo algo que só pode ser preenchido encontrando (e aceitando) o verdadeiro significado de quem somos, da nossa história e daquilo que realmente desejamos.
Psicóloga Clínica e autora do artigo “Perspetiva Psicanalítica dos Distúrbios Alimentares“
Imagem Por, Edward Hopper, “Soir Bleu” (Whitney Museum of American Art)
Notas de rodapé[+]
↑1, ↑2 | Glória, B., Panizzi, F., & Medianeira De Mello, M. (n.d.). PATOLOGIAS DO VAZIO NA CONTEMPORANEIDADE: UMA REVISÃO DA LITERATURA 2018. https://www.psicologia.pt/artigos/textos/A1236.pdf |
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