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Bumble, Tinder, Badoo. Diferentes apps, diferentes propostas para encontrar o amor. Estas são algumas das aplicações mais conhecidas e utilizadas em Portugal. Os utilizadores dividem-se entre elas na procura por estabelecer relações significativas, num mundo em que cada vez mais a vida (leia-se o trabalho e as contingências sócio-económicas) os empurram para o isolamento. Estas apps não são novas: o bumble existe desde 2014, o Tinder desde 2012 e o badoo desde 2006.

Um dado relevante sobre a utilização destas apps (e de outras do mesmo género) é que hoje podemos estabelecer relações que não se esgotam no amor ou numa “dinâmica exclusiva” de interesse sexual. Um exemplo disso é a app bumble que expandiu a “missão de encontrar o amor” para o encontro também de novas amizades e também contatos profissionais. É claro, hoje, que as aplicações (e o mundo digital de forma geral) se adaptam àquelas que são as necessidades manifestas e a necessidade de nos relacionarmos é algo intrínseco à nossa espécie.

Somos seres sociais, procuramos proximidade, procuramos sentir-nos aceites (sentir que pertencemos, sentir que somos cuidados), considerados (que podemos confiar, que somos entendidos, que somos uma prioridade) e apreciados (sentir que somos amados e que seremos lembrados).

Essas necessidades não se alteram (porque são mais do que legítimas), embora o meio que usamos para procurar satisfazê-las possa ser diferente. Diria que o preconceito se vai desvanecendo à custa da necessidade e do conhecimento. Alguns dos casais que recebo em terapia fizeram “match” nessas aplicações e se há uns anos existia constrangimento em dizê-lo, hoje é diferente (em parte, na minha opinião, porque o conhecimento sobre estas apps aumentou e foi-se desconstruindo o desconforto e a desconfiança que se cola quase sempre ao novo, ao desconhecido).

Como em tudo, persistem algumas perguntas entre os mais céticos e os persistentes. A mim, interessam-me particularmente as perguntas dos persistentes, dos que estão nas aplicações há algum tempo e nos quais começa a ser evidente alguma desesperança face a sucessivas “tentativas falhadas”. Uma das reflexões a fazer talvez seja esta:

  1. O que procuram hoje as pessoas num relacionamento amoroso?
  2. Qual a expectativa que têm relativamente ao que as apps facilitam?
  3. O que significa dar match?

A resposta para a primeira pergunta é complexa, envolta em muitos significados. Embora as pessoas tendam a responder coisas semelhantes no imediato, como “alguém em quem possa confiar”, “alguém com quem possa partilhar os melhores momentos da minha vida”, “alguém com quem possa construir um futuro”, aquilo que cada um procura num relacionamento é resultado de um processo complexo de socialização, isto é, deriva em grande parte das construções sociais que temos presentes sobre “o que é uma boa relação”, do histórico das nossas relações amorosas anteriores e também do histórico familiar que nos permitiu construir vínculos mais ou menos seguros.

Gostaria ainda que reparassem que as respostas começam sempre com “alguém que”. A resposta remete-nos, se nos detivermos um pouco nela, na expectativa de que o outro venha cumprir um papel e não na construção que ambos podem fazer desse lugar que é a relação.

Não é sobre “alguém que…”, mas sobre “um relacionamento onde…”

Qual a expectativa sobre o que as aplicações facilitam? Diria que o mais evidente é mesmo encontrar pessoas sem sair de casa. Basta um telemóvel e ligação à internet. A partir do sofá de casa encontram-se centenas de pessoas, com intenções à partida semelhantes e com um perfil definido que evidencia as eventuais semelhanças e diferenças e que permite uma escolha “mais rápida”. E os cliques começam. Como as conversas. Como a tentativa de compreender “se efetivamente estão alinhados ou não”. E essa tentativa não leva menos tempo porque se começou numa aplicação. O investimento é tão ou mais necessário do que quando começam frente a frente. As apps facilitam o encontro, mas não retiram tempo ao processo. Esse pode ser um “erro comum”, o de “passar de uns perfis para outros”, de estar numa busca desenfreada pelo “match perfeito”, sem se perceber que esse match se poderá construir todos os dias, na vida quotidiana.

Não é sobre ter “o match perfeito”, é sobre estar disponível para construir algo bonito em cima das imperfeições.

Há muitos “casais dating app” que construíram relações felizes. Quando os recebo em terapia – porque não são diferentes dos outros casais nas suas dificuldades – percebo que há algo que os mantém: a persistência. O compromisso com o “trabalho na relação” e a clara noção de que nenhuma app, nenhuma terapia fará milagres. Tudo é um meio para, um meio onde são eles os protagonistas, os principais agentes de mudança.

Não é sobre o contexto onde a relação começa, mas sobre o quanto decidimos investir nela.

Não podemos deixar para a aplicação aquilo que é só é possível construir com a nossa ação.

Adriana Bugalho

Psicóloga e Autora do artigo “A Ciência Por Trás do Sucesso das Relações Amorosas“ e “Relações Amorosas

Imagem Por, Tatyana Alanis – @French75studios

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