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Vontade de fugir, medo de entrar num sítio cuja fuga parece difícil, ataque de pânico… São coisas que te são familiares? Se sim, podemos estar a falar de perturbação de pânico com agorafobia.

A agorafobia é o medo de ficar em situações ou locais sem uma maneira de escapar facilmente, ou em que a ajuda pode não estar disponível no caso de a ansiedade intensa se desenvolver. Muitas vezes essa ansiedade intensa é o chamado ataque de pânico. Os ataques de pânico são uma onda repentina de medo intenso ou desconforto que atinge o pico em segundos a minutos. Os ataques de pânico envolvem a sensação de pelo menos quatro dos seguintes sintomas:

  • Palpitações, batimentos cardíacos ou frequência cardíaca acelerada
  • Suores
  • Tremores
  • Sensação de falta de ar ou sufocamento
  • Sensação de asfixia
  • Dor ou desconforto no peito
  • Náusea ou desconforto abdominal (por exemplo, diarreia)
  • Sensação de tontura, instabilidade, vertigem ou desmaio
  • Calafrios ou sensações de calor
  • Parestesias (dormência ou formigamento)
  • Desrealização (sensação de irrealidade) ou despersonalização (sensação de estar separado de si mesmo)
  • Medo de perder o controlo ou enlouquecer
  • Medo de morrer

E agora pergunto-te, quantos sintomas destes já sentiste até hoje?

A sensação de perda de controlo e de que se está a ficar “maluco” também são sintomas característicos do pânico. Podes até sentir que vais morrer a qualquer momento e intensificar o medo durante o ataque. Outro sintoma extremamente assustador que vejo muito na minha prática clínica é a despersonalização. Esta refere-se à sensação de que a pessoa não está conectada ao seu corpo. Apesar de muito assustador, é inofensivo. Estes sintomas podem ser assustadores, especialmente se surgirem do nada.

A ansiedade é mentirosa e quer tentar proteger-te! É biológico!

Muitas pessoas com pânico ficam surpresas com o facto de os sintomas de ansiedade serem tão fortes. Após uma crise de pânico, muitas pessoas sentem-se exaustas, stressadas e preocupadas. Estas sensações desagradáveis tendem a acompanhá-las durante o restante do dia, gerando-se uma bola de neve.

Algumas acabam por fazer check-ups de saúde para descartar as causas físicas dos sintomas e ficam hipocondríacas a achar que são demasiado vulneráveis. Há pessoas que podem ter apenas um único ataque de pânico e nunca mais sentir nenhum. E quando surge um ataque de pânico, pode acontecer uma de duas coisas: há quem continue a sua vida e ignore esse acontecimento, e; há quem fique preso a esse evento e nunca mais consiga viver a sua vida de forma funcional (o nosso sistema cognitivo verbal que nos emaranha nos nossos pensamentos e gera sofrimento). Neste caso falamos de agorafobia.

Se já passaste por isto tudo e não sabias o que era, provavelmente foi um ataque de pânico, os parágrafos seguintes são fundamentais para ti e merecem a tua atenção.

Os ataques de pânico são assustadores, mas não são propriamente perigosos para a tua saúde física, caso sejas um jovem ou adulto saudável sem problemas de saúde previamente identificados. Parece estranho, visto que o pânico é a sensação de medo mais intensa que podemos sentir nas nossas vidas, mas na regra geral não existe perigo nenhum, sendo que apesar de intensas, as sensações de pânico não são perigosas de todo.

Tal como acontece com a ansiedade, as pessoas que se preocupam com o seu próprio pânico e tomam medidas preventivas constantes para tentar evitar a possibilidade de ter mais um ataque de pânico sofrem de perturbação de pânico.

Lembrando de que os ataques de pânico são mais comuns do que se pensa e não são assim tão perigosos, ter um ataque de pânico na vida não significa que: há algo errado contigo, vais enlouquecer ou morrer, vais desmaiar a qualquer momento e/ou, tens de ser internado. Na verdade, quando falamos apenas de 1 ataque de pânico isolado, provavelmente não será tratamento psicológico. Tal só faz sentido quando começas a estar demasiado preocupado com a possibilidade de ter novos ataques de pânico, a ponto deste medo começar a interferir com a tua vida. A ansiedade é mentirosa e quer tentar proteger-te! É biológico!

Uma em quatro pessoas que vão às urgências com dores no peito estão a ter ataques de pânico/crises de ansiedade.

Os sintomas de um ataque de pânico são tão fortes e opressores que muitas pessoas realmente vão parar às urgências do hospital porque acham que estão a morrer. Há inclusive estudos que mostram que uma em quatro pessoas que vão às urgências com dores no peito estão a ter ataques de pânico/crises de ansiedade.

Mas o que está o corpo e a mente a fazer quando tens um ataque de pânico?

Voltamos outra vez à história do cérebro antigo vs cérebro atualizado. Na realidade, os nossos cérebros não mudaram muito desde a Idade da Pedra. Eles foram corretamente projetados para detetar vários tipos de ameaças do mundo real e ainda hoje contém muita da programação que foi desenvolvida para ajudar os nossos antepassados a sobreviver naqueles tempos.

Normalmente, há apenas uma gama limitada de comportamentos úteis em situações em que enfrentas uma ameaça física. Estes incluem:

  • Fugir: muitas vezes faz sentido fugir de uma situação perigosa para viver mais um dia. A frase “mais vale prevenir do que remediar” resume-o perfeitamente.
  • Lutar: numa situação perigosa, lutar pode ser útil, uma vez que, se lutarmos e vencermos, acabaremos por eliminar o perigo. O simples facto de parecermos estar preparados para lutar pode fazer um oponente recuar.
  • Congelar: em algumas situações, pode fazer sentido congelar e imobilizarmo-nos diante do perigo, em especial logo no início. Isto porque alguns predadores atacam apenas quando detetam o movimento, pelo que ficares imóvel caso ainda não tenhas sido localizado pelo predador poderá salvar-te – este é um mecanismo já bastante arcaico.

Resumidamente, a psicologia chama a isto reação de luta, congelamento ou fuga. A resposta lutar-fugir-congelar provoca mudanças em todo o corpo. Cada uma destas mudanças ocorre por um motivo: para nos ajudar a continuar vivos se houver uma ameaça real. A resposta de luta-fuga-congelamento é muito sensível e é ativada, mesmo que não haja perigo real (falso alarme), uma vez que o nosso cérebro prefere viver do que morrer. Assim, perante a ameaça, o organismo faz toda uma preparação automática e rápida do nosso corpo e mente para o potencial perigo imaginário.

Ser programado para reagir desta forma ajudou os nossos antepassados a sobreviver ao perigo, levando-os a agir rápida e automaticamente quando o perigo estava próximo. Todos nós temos ainda a mesma programação e o desejo de reagir automaticamente desta forma quando sentimos um perigo. O problema é que esta forma de reação automática vem com algumas desvantagens de série:

  • É melhor prevenir do que remediar: O cérebro opera segundo o princípio de que mais vale evitar os perigos do que ter de lidar com eles e, por isso, prefere disparar muitos alarmes falsos do que arriscar falhar um perigo real. Daí o meu dito de que a ansiedade é mentirosa e que só nos quer proteger. Isto significa que estamos propensos a sentir medo repentinamente, mesmo quando não há perigo real (tal como, por exemplo, os predadores, roedores, aves e peixes).
  • Realidade vs. imaginação: O nosso cérebro não é bom a perceber a diferença entre as ameaças reais (do mundo real) e as ameaças imaginárias (que nos próprios construímos). Às vezes, isto pode desencadear a resposta de luta ou fuga perante ameaças que só existem na nossa cabeça; por isso, até pode estar tudo muito bem na nossa vida e, de repente, começamos a sentir ansiedade sem um motivo aparente.

Assim que uma ameaça é detetada, o sistema nervoso autónomo simpático (o sistema de ameaças) fica ativo. Isto pode acontecer no caso de uma fobia específica (aranhas, cobras, cães, gatos), ansiedade social, agorafobia ou, simplesmente, devido às sensações do próprio corpo sem gatilho aparente (perturbação de pânico). Há uma parte deste sistema que diz respeito as nossas emoções e outra que prepara o teu corpo para a ação.

1-3 pessoas em cada 100 sofrerão de perturbação de pânico com agorafobia, e ainda mais pessoas já terão experienciado um ataque de pânico pelo menos uma vez na vida. Como disse, ter experienciado apenas um ataque de pânico isolado não faz com que seja necessário acompanhamento psicológico. Mas, caso seja o caso, a terapia cognitivo-comportamental (TCC) é uma abordagem terapêutica extremamente eficaz para a perturbação de pânico: cerca de 80% das pessoas com esta perturbação que terminam o processo terapêutico cognitivo-comportamental chegam ao fim do tratamento sem pânico.

Sophie Seromenho

Psicóloga Clínica e Autora do livro “Não é Loucura, É Ansiedade“. Escritora do artigo “Ansiedade: Pazes com o Passado

Imagem Por, Edvard Munch, “The Scream” (Munch Museum)

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