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O meu grande erro foi tratar este amor como um amor ordinário quando nunca fomos mundanos.
Devia ter chegado ao pé de ti e perguntado:
– Vamos?
Parecia-me loucura. Éramos dois desconhecidos. Mas esse sempre foi o teu efeito em mim: davas-me vontade de cometer loucuras e, acima de tudo, coragem para as fazer.
Talvez não tivesse sido uma loucura assim tão grande. Tínhamos o mundo pela frente e nada que nos prendesse ao chão.
Assim que te vi percebi que nunca me irias pertencer, que pertencias ao mundo. E, por isso, deixei-te voar. Incentivei-te a levantar voo e amparei-te nas tuas quedas.
Braços sempre abertos para partires, braços sempre abertos para ficares.
Tu escolheste fechar as asas e ficar. E eu nunca te disse aquelas palavras que queriam voar desde o primeiro dia:
– Vamos?
Um convite para sermos a casa um do outro. Para vermos o mundo como ele é, para vermos o mundo como nós somos. Essa é a minha ideia de felicidade, essa é a minha ideia de um amor extraordinário: ser a casa de alguém.
Uma onde seja difícil arranjar água quente e em que chegues a casa a saber a mar. Uma onde me saibas descrever cada pássaro que canta ou voa acima das nossas cabeças. Uma onde te visto de poesia viva e te aconchego nos meus dedos. Onde o anoitecer faz dos teus braços a sua cama e o brilho das estrelas é tão visível quanto o do teu olhar. Onde haja uma rede estendida numa oliveira e dois corpos a balançar na paz de se amarem.
– Vamos?
Nunca te fiz essa pergunta.
Em vez disso, abri-te os braços e deixei-te voar. E nunca voei contigo.
Ora aí está: o meu grande erro foi tratar este amor como um amor ordinário quando nunca fomos mundanos.
Devia ter chegado ao pé de ti e perguntado:
– Vamos?
Parecia-me loucura. E é loucura. Mas não precisamos todos de alguma loucura na nossa vida? E, tu, amor, eras toda ela. Afinal de contas, não sou eu louca por ti?
O tempo já passou. Já fomos o porto de abrigo um do outro. E também já fomos sem-abrigo. E eu já não tenho nada a perder senão os meus sonhos. Então, pergunto-te:
– Vamos? Ser loucos… ou felizes…?
Na verdade, é tudo o mesmo. Eu só quero ser a tua casa.
– Vens morar em mim?

Márcia Filipa

Escritora

Imagem Por, Edward Hopper, “High Noon

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