– Promete-me que não me amas.
– Não te amo.
Não te queria chamar mentiroso. Eras a pessoa mais honesta que alguma vez tinha conhecido.
– Não te amo.
Procurei nos teus olhos a confirmação de que era mentira. Não a encontrei. Eram gelo e eu não os podia derreter por muito que os meus fossem água.
Mas eu sabia. Naquele gelo tão polido, vi o reflexo do amor que tanto se afoga que se congela – não percebendo que só fica mais preso, que gelo não se combate com gelo, mas com calor. O calor de um abraço que não te larga, um sorriso solto nos cantos dos lábios, um silêncio que ama mais do que todos os livros de amor.
Mas tu eras gelo; e eu era água. Ambos afogados na nossa dor.
Tentei tocar-te de todas as maneiras, mas escorregavas-me pelos dedos, esmorecias-me nos cantos da boca, congelavas-me a alma.
– Não te amo.
Mentiroso.
Como se eu não te conhecesse da superfície da pele fria às profundidades da alma quente.
Fui feita para mergulhar em ti: desde o nascer das lágrimas ao desaguar no suor da tua pele.
– Não te amo.
Mentiroso.
Tu eras amor.
Quer fosses um belo dia de verão ou uma tempestade em alto-mar – a tua essência permanecia sempre a mesma: fundamental à vida.
– Não te amo.
Penteaste as ondas dos meus cabelos, jorraste nos meus olhos esperançosos, fluíste pela minha face, escorreste nos meus lábios entreabertos, desembocaste na minha pele, desaguaste no meu peito quente.
Mentiroso.
Como eu quero acreditar que transbordas de saudade, que te estendes em lágrimas salgadas, que te divides ao meio para deixar a esperança passar.
Como eu quero acreditar que ainda moro em ti, na imensidão do “chega-te” a mim, na cheia de te amar.
– Não te amo.
Mentiroso, mentiroso, mentiroso.
O vazio com que o disseste… devia ter percebido que era mentira. As palavras estão sempre cheias.
– Não te amo.
Mentiroso.
Nem com toda a frieza do mundo, o gelo deixa de ser água…
Imagem Por, Seok Cheol Ji, “Time, Memory and Existence” (Korean Art Museum Association)
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