Os hábitos fazem parte de quem nós somos, pequenos detalhes, rotinas, comportamentos que nos caracterizam, que foram sendo enraizados por diversos motivos. Pela nossa história de vida, pelas relações que fomos tendo, e sobretudo concretizam-se como mecanismos de atuação, padrões de repetição, mais ou menos adaptativos consoante a sua natureza.
Quando destes padrões emerge sofrimento, mal-estar, fica visível o seu potencial de adoecimento. Na sua maioria estes mecanismos são invisíveis, quer isto dizer que são inconscientes. É precisamente o trazer à consciência destes padrões e comportamentos que pode permitir a sua transformação.
Este processo de tomada de consciência, pode ser feito por um trabalho de autoconhecimento profundo, de introspeção, que são precisamente potenciados pela psicoterapia. Uma relação a dois, entre paciente e psicoterapeuta, que permite o desbravar de caminhos inóspitos, muitas vezes nunca antes pensados, nunca antes verbalizados. E é por aqui que a dois, se vive o sofrimento, se traduzem padrões de comportamento, se falam sobre emoções.
A mudança transformativa, toma o seu lugar no seio da experiência relacional que a psicoterapia proporciona. Quando somos vistos pelo outro, quando a nossa dor é reconhecida, quando somos elogiados de forma justa, quando validam o nosso cansaço e o nosso esforço, é aqui que se abre a possibilidade de nós próprios nos começarmos a ver de outras formas, que nunca antes nos tínhamos permitido.
Em cada fim há sempre um recomeço, seja lá do que for. O início do novo ano e término do anterior é sempre propicio a este tipo de reflexões, sobre quem somos, para onde queremos ir. Numa visão psicoterapêutica, é assim que a mudança e a evolução ocorrem, vamos reconhecendo quem somos, aprendendo o que nos fez ser assim e só depois conseguimos compreender ao nível da consciência as mudanças que precisam de ser feitas, ou não. O desejo de mudar só nasce aqui, quando o conflito fica visível.
Não queiramos fórmulas mágicas, nem checklists de objetivos para cumprir, a vida não se mede assim, nem o sucesso, nem a realização pessoal. Esta é uma jornada subjetiva, individual, cheia de percalços e mudanças que o desconhecido semeia. Os últimos anos ensinaram-nos precisamente isto: temos de ser flexíveis connosco mesmos, fomos forçados a adaptar-nos a situações excecionais que nunca antes havíamos experienciado. O tempo é outro, é de conexão connosco, com os outros, só assim a vida toma sentido e as mudanças têm propósito.
Por: Rita Mateus (Psicóloga Clínica)
Obra por Vincent van Gogh, “The siesta (after Millet)”
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