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À medida que se desenvolve, o ser humano vai construindo uma noção de si mesmo. Esta noção envolve aspetos de diversos tipos e integra um caris mais valorativo e um mais descritivo. O primeiro dá pelo nome de autoestima e envolve a noção de valor e estima atribuído ao eu (como nos valorizamos a partir do que somos). Por sua vez, ao segundo atribui-se a denominação de autoimagem e abarca as características que constam na constituição do eu (como nos vemos em termos de características,  competências e capacidades). Ambas as componentes vão ganhado forma através das interações que temos com o exterior, desde as relações mais precoces, através  também das narrativas que vamos escutando e integrando sobre nós e ainda através do que apreendemos das experiências que vivenciamos.

A partir destes dois conceitos ouvimos dizer, com frequência, que “temos que ter autoestima”, como se de algo palpável e quantificável se tratasse, numa relação dicotómica entre aqueles que a têm e os que a não têm. Talvez possamos pensar na autoestima,  ao invés disto, como algo que pode ser mais positivo ou mais negativo, ou até mais elevado ou mais baixo, dependendo de como nos valorizamos e estimamos. No entanto, e analisando mais ao pormenor, podemos, ainda assim, retirar daquele dizer um alerta: o alerta de que é importante que nos valorizemos.

Porque é então importante que nos valorizemos? É importante pois o impacto do valor que nos atribuímos a nós mesmos, na nossa vida, é tremendo! Ora vejamos, quanto mais nos valorizamos mais reconhecemos a nossa importância, mais nos empenhamos em cuidar de nós e em satisfazermos as nossas necessidades. Além disso, com mais facilidade priorizamos o nosso bem estar e melhor conseguimos relacionar-nos com o exterior sem sermos constantemente invadidos de pensamentos e emoções negativos acerca de nós. Pelo contrário, se o valor que nos atribuímos é baixo, tendemos a desvalorizar as nossas necessidades e o nosso querer, e o nosso bem estar assume um papel secundário, pois afinal de contas não vale a pena investir e cuidar de algo que não tem valor. Neste caso, quando interagimos com os outros surgem sentimentos de inferioridade, ou até superioridade como forma de compensarmos o vazio que sentimos, e inseguranças constantes, que dificultam o estabelecimento padrões de comportamento saudáveis e satisfatórios connosco e com os outros. Em paralelo, até mesmo a forma como resolvemos problemas diários e tomamos decisões é influenciada pela nossa noção de valor pessoal.

Surge então uma questão inevitável: Como podemos construir uma autoestima saudável? Para responder a esta questão é fulcral adicionarmos dois ingredientes essenciais: o autoconhecimento e a autocompaixão. A base destes dois ingredientes surge com as assunções claras de que, em primeiro lugar, dificilmente gostamos mais ou gostamos menos de algo que desconhecemos e, em segundo lugar, que não conseguimos gostar de algo que não aceitamos tal como é e que julgamos mais do que compreendemos.

Assim, a noção de autoconhecimento diz-nos que se não tivermos uma boa e precisa noção das nossas potencialidades mas também das nossas limitações, pouco podemos tecer acerca do valor que nos atribuímos ou até de como podemos fazer para nos protegermos e  cuidarmos de nós. No fundo, se estivermos com contacto com o nosso mundo interno torna-se mais possível que qualquer ação que tenhamos contribua, de modo adequado, para o nosso bem estar. Desta forma, quanto mais nos conhecermos mais nos podemos amar.

Se com o autoconhecimento respondemos à questão “gostar do quê?“, com a autocompaixão trazemos o fator “como” a esta equação. Como podemos então construir uma relação saudável connosco mesmos? Importa reconhecer que não temos que, nem temos como, gostar de tudo em nós. Somos seres em permanente construção, num sistema biopsicosocio-cultural que nos influencia e que influenciamos constantemente. Somos sensações, memórias, pensamentos e emoções sobre os quais não temos um controlo absoluto e como tal erramos e temos características das quais nem sempre nos orgulhamos. Ainda assim, se conseguirmos olhar para nós com mais compreensão e menos julgamento será mais possível que sejamos aliados de nós próprios nesta travessia, por vezes incerta e desafiante, que é a vida.

Por: Marta Pamol (Psicóloga Clínica e da Saúde)


Obra por René Magritte, The Double Secret

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