Distinguir a diferença entre um psicopata e sociopata não é de todo uma tarefa fácil. Existe muita controvérsia, até no mundo científico, entre estes termos que são frequentemente utilizados como sinónimos.
De facto, a sociopatia e a psicopatia apresentam várias características em comum, o que as torna mais difíceis de se distinguirem. Até à data, nem a psicopatia nem a sociopatia são reconhecidas como diagnósticos formais em manuais de perturbações mentais, como por exemplo o Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais (DSM-5), contudo ambas satisfazem o diagnóstico de Perturbação Antissocial da Personalidade, cujos critérios são: a) incapacidade para se conformar com as normas sociais no que diz respeito a comportamentos legais, como indicado por atos repetidos que são motivo de detenção; b) falsidade, como indicado por mentir repetidamente, usar nomes falsos ou enganar os outros para obter lucro ou prazer; c) impulsividade ou incapacidade para planear antecipadamente; d) irritabilidade e agressividade, como indicado por conflitos e lutas físicas repetidos; e) desrespeito temerário pela segurança de si próprio e dos outros; f) irresponsabilidade consistente, como indicado pela incapacidade repetida para manter um comportamento laboral consistente ou honrar obrigações financeiras; g) ausência de remorso, como indicado pela indiferença ou racionalização sobre ter magoado, maltratado ou roubado alguém. Os sociopatas representam cerca de 30% dos diagnósticos de Perturbação Antissocial da Personalidade, aproximadamente mais do dobro dos diagnósticos dos psicopatas (3 a 15%).
Psicopatas e sociopatas partilham características como a ausência de remorsos e sentimentos de culpa, não assumem a responsabilidade dos seus atos, demonstram desprezo pelas leis e normas sociais, desrespeito pelos direitos dos outros, falta de empatia e uma tendência para a violência ou comportamento agressivo. É importante de notar que tanto os psicopatas como os sociopatas não são necessariamente violentos, muitos podem ser apenas manipuladores, utilizando várias estratégias e artimanhas para conseguirem os seus objetivos.
A Diferença
Para alguns investigadores estes conceitos diferenciam-se em certas características, o que faz com que não sejam exatamente iguais e mereçam uma distinção. A principal distinção talvez passe pelo famoso debate entre genes e ambiente. Acredita-se que a psicopatia é de natureza genética e biológica, ou seja, é uma condição que nasce com os indivíduos, é inata, e parece ter uma forte componente hereditária. Já a sociopatia é considerada como adquirida, isto é, ela é desenvolvida ao longo da vida e pode resultar de uma lesão cerebral, ambiente familiar e/ou comunitário adverso, abuso físico e/ou emocional ou negligência durante a infância. Estas experiências precoces mal adaptativas dessensibilizam o indivíduo a respostas emocionais e originam uma aceitação da agressividade.
Apesar de ambas as condições demonstrarem falta de empatia e de culpa, os sociopatas são por vezes capazes de criar laços, mostrar alguma empatia, mas apenas com familiares e pessoas mais próximas. O mesmo não acontece com os psicopatas. Os sociopatas são também mais impulsivos e erráticos e, portanto, mais suscetíveis de ser detidos e apresentam mais dificuldades em manter um emprego. Contrariamente, os psicopatas são menos impulsivos, mais cautelosos, conseguem ter um emprego estável, planeiam mais as suas ações e arranjam facilmente desculpas para o seu próprio comportamento, quando apanhados, para minimizar as consequências.
Os psicopatas são dotados de um encanto superficial, aparentemente dão-se bem com os outros, são divertidos, conversadores, assumem uma postura pseudointelectual, capazes de dar rapidamente a volta às questões, com inteligência. Contudo, esse conhecimento e charme são apenas superficiais. Por outro lado, os sociopatas tendem a ter relações com os outros mais complicadas por serem mais explosivos e menos calculistas.
A literatura sustenta que a sociopatia e a psicopatia são provavelmente manifestações extremas da Perturbação Antissocial da Personalidade. É importante trabalhar no sentido de existir um consenso entre os cientistas e investigadores sobre a definição destes conceitos, para facilitar a avaliação e intervenção junto destes indivíduos.
Atualmente existe um instrumento de referência na avaliação da psicopatia desenvolvido por Robert Hare, Hare Psychopathy Checklist-Revised (PCL-R) – 1991. Esta escala divide-se em 20 itens característicos da psicopatia e sustentados empiricamente. A nível interpessoal, os psicopatas apresentam um encanto superficial, comportamento sexual promíscuo, relacionamentos conjugais numerosos e de curta duração, sentido grandioso do valor de si próprio, mentir patológico e estilo manipulativo. Ao nível do afeto, a psicopatia remete para uma superficialidade afetiva, ausência de empatia, não acatamento das suas responsabilidades e ausência de remorsos ou sentimentos de culpa. Ao nível do estilo de vida, estes sujeitos apresentam ausência de objetivos realistas, um estilo de vida parasita, impulsividade, necessidade de estimulação/tendência para o tédio e irresponsabilidade. Por fim, ao nível do comportamento antissocial, a psicopatia envolve deficiente controlo comportamental, comportamento problemático precoce, historial de delinquência juvenil, versatilidade criminal e revogações de medidas alternativas ou flexibilizadoras da pena de prisão (e.g. pulseira eletrónica).
Embora exista uma relação entre comportamento desviante e psicopatia ou sociopatia é necessário trabalhar no sentido de desmistificar alguns mitos, como, por exemplo, que todos os assassinos em série são psicopatas ou sociopatas ou que a maioria da população reclusa apresenta uma destas condições. A maioria dos estudos nestas áreas é realizado em meio prisional e quase exclusivamente com indivíduos do sexo masculino, o que demonstra algumas limitações a nível de representatividade da amostra.
Por: Catarina Abrunhosa (Psicóloga)
Obra por, Caravaggio, “Judith Beheading Holofernes”
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