Na esquina da imensidão, observo e só me vejo a mim. À minha volta, antes, durante e depois do que quer que seja, estão dezenas de pessoas de sorriso aberto e mão estendida à espera do que eu lhes posso dar.
Mas eu hoje sinto-me fraca. Fraca de forças, de objectivos, de vontade e de luta. Porque hoje, em vez de dar, eu preciso de receber.
E foi quando tomei essa decisão e dobrei a esquina, que vi começar a desaparecer, um por um, os componentes dessa gente que formava uma multidão. As suas mãos, espetadas e firmes, rapidamente caíram, moles e inertes, ao lado dos corpos que, rapidamente também, num compasso que desconfiei inato, começaram a recuar, até desaparecer, começaram a desaparecer, até sobrar apenas eu.
Percebi que quando temos algo para dar, há muita gente à nossa volta para receber. Mas que, ao invés, quando precisamos que alguém nos dê alguma coisa – carinho, afecto, conforto ou uma palavra amiga – a fila diminui, até nada restar.
O que move o ser humano? Onde está a empatia?
Talvez se calçássemos os sapatos uns dos outros, as pedras que ficam no caminho formassem, quem sabe, um tapete sobre o qual fosse confortável caminhar. Porque nós, somos um todo. Porque a vida é um ciclo. Um ciclo que, como é próprio, se repete a uma dada altura, fazendo do fim um novo começo.
Hoje, eu. Amanhã, tu. Nunca digas desta água não beberei…
Nádia Carnide Pimenta
Escritora e Autora dos textos “A Casa Vazia“, “Cartas“, “Vitória“, “Não Te Percas de Quem És” e “Cálice da Loucura“
Imagem Por, René Magritte, “Not to Be Reproduced [La reproduction interdite]” (Museum Boijmans Van Beuningen)
Também Gostarás:
- Conta-me Conta-me. Conta-me outra vez a história do cavaleiro e da espada. Diz-me outra vez que ele salvou a princesa dos...
- A Última Tradição Como nascem as tradições? As tradições formam-se por meros caprichos do acaso. Assim pelo menos aconteceu com o nosso círculo...
- Não Te Percas de Quem És Hoje o sol sorri. Mesmo que chova! Porque tudo depende da perspectiva, da maneira como encaramos as coisas e olhamos...
- Os Pensamentos são como Cerejas Às vezes pesam-me todos os dias que já vivi, como um prisioneiro que arrasta uma bola de ferro presa a...
Mais
A Linha da Solidão
Era uma publicidade da SOSolidão. Não tinha nada a perder, ele que, afinal, já tinha perdido tudo. Ajeitou-se no sofá, suspirou e ligou.
Ontem Enterrei o Meu Melhor Amigo
Ontem enterrei o meu melhor amigo. Choveu muito, mas nem a chuva afastou aqueles que se quiseram despedir dele.
Decadência
A tua decadência faz-te, a partir de um certo milésimo de segundo, não te querer livrar dela nunca mais – esse, é o pico mais grave.
É Natal… !?!
As barraquinhas de Natal agora assustam-me e à medida que as luzes vão se erguendo pelas cidades o meu coração bate mais rápido.
Melodia do Nosso Adeus
Quanto mais ando menos saio do sítio, quanto mais te esqueço mais te quero. Quanto mais tempo passa, mais penso em ti.
O Artesão de Poemas
O meu avô Alberto era artesão e poeta. Tinha sonhos nas mãos, mas não sabia escrever. Retirava da vida a inspiração.