Já o sol raiava quando te vi pela primeira vez. Era uma tarde de verão e as ondas explodiam assim que batiam nas rochas húmidas. Por algum motivo decidi ir à praia naquele dia, apesar de não gostar do calor, da areia a sujar-me a toalha em que me deitava, das mãos sujas com os grãos finos que se colavam a todo o meu corpo suado.
Apesar de não gostar dos dias quentes, apetecia-me sentir o cheiro a maresia.
Lembro-me perfeitamente – saí de casa às pressas para apanhar o autocarro, estava carregada com dois sacos e o motorista foi antipático comigo.
Quando cheguei, o ânimo já não era o bastante para ficar até ao entardecer. Ainda que gostasse de estar na praia nos finais de tarde, quando as pessoas já tinham voltado às suas casas e o mar estava mais calmo, o apetite daquele dia era só esperar o próximo autocarro e voltar a casa, deitar-me no sofá a ver um seriado qualquer ou a ler um livro da minha estante.
Mas aquela tarde melhorou quando te voltaste para mim e perguntaste, inocentemente, se tinha protetor solar. Chegaste de fininho, assustaste-me e logo a seguir provocaste-me uma gargalhada – vi o teu sorriso, pela primeira vez, nesse mesmo dia.
Tinhas a pele bronzeada, o cabelo emaranhado num rabo de cavalo despojado. As maçãs do rosto estavam queimadas devido ao calor, os teus olhos brilhavam.
Estendi o protetor solar que tinha guardado na mochila há não muito tempo e perguntei se querias ajuda para o aplicar. Ergui-me para te auxiliar e quando passaste as mãos pelo cabelo para o afastar das costas, senti que o meu corpo entrou em transe. Como se, de súbito, estivesse mais calor naquele raio de cinco metros do que na praia toda.
Agradeceste e despediste-te de mim. Tentei ver se estavas acompanhada e, para meu espanto, a tua companhia era um grande cachorro que esperava por ti, deitado na toalha.
Não vou mentir, no dia seguinte voltei à praia na esperança que lá estivesses, estava determinada a chamar-te, de alguma maneira desejava poder falar mais uma vez contigo. E, a verdade, é que não foi preciso ansiar muito pela tua chegada, vieste ter comigo novamente antes mesmo de te ver descer o passadiço e tocar na areia quente.
Não perguntaste se tinha protetor solar, em vez disso, pediste licença para te sentares comigo. Cheguei-me para o lado e dei-te espaço na minha toalha, acomodaste-te e sorris-te.
Naquela altura ainda nem sabia o teu nome, mas quase podia ter a certeza que aquele sorriso era verdadeiro.
Lembro-me que conversamos horas a fio, como se nos conhecêssemos de algum lugar.
Nesse dia, fiquei até ao entardecer – contigo. Compraste pizzas e bebemos coca-cola com demasiado gás.
A despedida, nesse dia, não foi dolorosa. Senti o teu abraço apertado, o cheiro a cabelo salgado dado aos mergulhos que te arriscaste fazer no mar bravo.
E quando cheguei a casa tinha uma mensagem tua a agradecer. Foi como ar fresco no meio de tanto calor.
Hoje, contigo a fazer as malas para te juntares a uma vida comigo, sinto-me como no primeiro dia que te vi. Esperançosa, feliz, com os dias leves e, ao mesmo tempo, ridiculamente cheios de amor.
Porque o teu sorriso continua demasiado verdadeiro para eu duvidar dele, as tuas palavras continuam demasiado credíveis para eu sequer cogitar pensar na possibilidade de elas não serem reais. Porque, tu, com roupa amassada e cabelos despenteados, continuas a ser a mulher dos meus sonhos.
Gabriela Meireles
Escritora e Autora de textos como “Dias Quentes, Cheios de Amor” “Monólogos Durante Madrugadas” e “Amor em Abstinência“
Imagem Por, Paul Gustav Fischer, “Sunbathing in the Dunes”
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